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Tramas em Animes | Artigo



Este texto é inspirado completamente na Aula 16 do Curso Online de Cinema do crítico, professor e cineasta Arthur Tuoto; mesmo que se baseou no livro Story, de teórico Robert McKee.


Mas o que é uma trama?

Trama é basicamente a forma como a narrativa de uma obra irá de desenvolver. Não existe necessariamente uma regra ou formula para como uma história deve ser contada, mas existem alguns princípios e estruturas bem comuns. Como fornecido na aula do qual esse texto é inspirado, irei citar apenas 3 delas, que são as estruturas mais comuns em muitas obras, e também vou traduzir de uma ideia para filmes, para a animação japonesa.


Arquitrama

Nas arquitramas (ou estruturas clássicas), é a forma mais convencional de se desenvolver uma história, com um começo, meio e fim. Normalmente, o conflito principal desse tipo de obra é bastante concreto, e tem eventos externos.

Fullmetal Alchemist: Brotherhood é um bom exemplo de uma arquitrama. Não apenas pela forma como a história progride, com um começo, meio e fim muito bem definidos, mas também pelos conflitos do mesmo serem algo que toca aquela realidade. O anime tem um motivo bem direto, com Edward tentando encontrar uma forma de recuperar o corpo de seu irmão, Alphonse. E durante essa jornada, ambos vão descobrindo diversos mistérios e problemas envolvendo aquela sociedade.

O anime conclui todos os conflitos que deixa em aberto de forma concreta e com uma linearidade, tornando FMAB um anime com uma estrutura clássica.


Minitrama

Nas minitramas (ou estrutura minimalista) é um tipo de história onde o conflito principal da obra é interno, não necessariamente tocando aquela realidade.

Nos quatro primeiros episódios de Aoi Bungaku Series, dirigido por Morio Asaka, muito do que se passa na vida do personagem Yozo Oba é uma luta interna e psicológica do personagem contra ele próprio. Cada decisão e frustração tomada pelo personagem tem sempre resultados que vão colocando o personagem em uma decadência maior.

O conflito apesar de partir de alguns eventos externos, tem mais consequências internas na vida do personagem. O que caracteriza a trama desses episódios como uma estrutura minimalista.


Antitrama

Em uma antitrama, teremos uma rejeição por uma estrutura convencional. Normalmente, esse tipo de obra não segue uma linearidade, e também não possui um final fechado. E até mesmo a realidade desse tipo de obra não tem necessariamente uma consistência.

Um bom exemplo de uma antitrama em animes é de Mousou Dairinin (Paranoia Agent) de Satoshi Kon. Nesse anime, vemos mais um problema concreto, partindo do antagonista Shounen Bat agredindo pessoas aleatoriamente na rua, e alguns investigadores tentando pega-lo e entender o que está acontecendo. O anime mostra a vida de alguns personagens com problemas sociais, esses que coincidentemente são agredidos pelo Shounen Bat. A realidade começa a perder o sentido com a medida em que os episódios vão passando, e de uma hora para outra, não tem mais como saber o que é ou não real.

Isso na verdade é bastante comum em várias obras do Satoshi Kon. Partindo de um problema real, e o tornando ambíguo para mais tarde distorcer a realidade vivida pelos personagens.


Mais de uma estrutura

Não existe uma regra que a obra deve necessariamente seguir apenas uma das estruturas descritas acima. Por exemplo, em Ashita no Joe de Osamu Dezaki, o personagem do Joe enfrenta vários conflitos externos durante toda a narrativa, tendo que passar pela prisão, por diversos torneios e confrontos como forma de redenção, o que caracteriza uma arquitrama. Mas ao mesmo tempo, o personagem em vários momentos enfrenta diversos conflitos internos, de incertezas, medo, frustração etc. O que também caracterizaria Ashita no Joe como uma minitrama.

Outro exemplo é Ergo Proxy de Shuukou Murase. O anime parte de uma arquitrama, mostrando a perseguição e sobrevivência do personagem Vincent Law na parte externa daquela sociedade. A estrutura segue linear até por volta do episódio 13, quando repentinamente o anime passa a ficar episódico. Começam a acontecer diversas situações aleatórias e bastantes ambíguas, e não tem mais como saber o que é ou não real. E o final também fica bastante em aberto, o que caracteriza uma arquitrama e antitrama.


Uma coisa que deve ter sido bastante perceptível ao ler o texto acima, e também os exemplos citados, é que independente de ser uma obra com estrutura de minitrama ao antitrama, todas sempre partem de uma arquitrama. O conflito externo é sempre o ponto de partidas para quaisquer que sejam os eventos acontecidos na obra.

Por exemplo, o que leva a distúrbio psicológico do personagem do Yozo Oba em Aoi Bungaku Series são diversos acontecimentos externos, que depois se internalizam.

Em Mousou Dairinin, o que leva os eventos imagéticos do anime a acontecerem são as ações concretas do Shounen Bat.

Talvez com exceção de obras puramente com intenções experimentais, a maioria das narrativas vai sempre partir de uma problema concreto.


Realidade consistente e inconsistente

O que define a realidade de uma obra está nas regras que o seu próprio universo segue, e não necessariamente em se passar em nossa realidade.

Fullmetal Alchemist: Brotherhood é um anime que não se passa em nossa realidade, mas que tem sim um universo concreto, e com regras próprias. É um bom exemplo de uma realidade consistente.

Já em Serial Experiments Lain de Ryuutarou Nakamura, o anime se passa em nossa realidade, e também parte de acontecimentos reais (como o suicídio da Chisa Yomoda). Mas a realidade não tem uma consistência exata. É um anime onde existem diversas situações muito imagéticas e até abstratas. A realidade dos personagens e da Wired tem uma certa conexão. A forma como o mundo se molda não segue um principio próprio, e está sempre mudando. É um anime com uma realidade inconsistente. Lain também é um bom exemplo de uma antitrama.

Os anime de Hayao Miyazaki tem uma ambiguidade nisso, já que a maioria se passa em uma realidade muitas vezes fantasiosa, como em Mononoke-hime ou Howl no Ugoku Shiro, ou que partem da nossa realidade e ser tornam fantasiosas, como em Sen to Chihiro ou Tonari no Totoro.

Mesmo sendo animes que seguem regras próprias em seus mundos, Miyazaki proporciona alguns momentos visuais que vão além da fantasia dos seus universos, e que beiram também uma relação imagética. Muitas vezes partindo que acontecimentos que tem envolvimento com a natureza.


Neon Genesis Evangelion

Na minha visão, Neon Genesis Evangelion seria o anime que melhor se encaixa dentro de todos os campos que envolvem uma trama.


O conflito principal de Evangelion, e aquele que que movimenta todos eventos do anime é a luta entre os protagonistas que usando os robôs chamados de Evas, para combaterem os intitulados Anjos, que querem invadir e destruir o nossos planeta. Esses são os acontecimentos que mais tocam a superfície daquele mundo. São acontecimentos concretos, em que nós vemos e cremos em tais lutas. Isso se caracteriza como uma arquitrama.

No desenrolar dos episódios, os personagens principais além de passarem e enfrentarem esses conflitos contra os Anjos, também enfrentam problemas internos e existenciais. Em vários episódios, o personagem de Shinji Ikari não tem uma motivação exata para viver ou se relacionar. O personagem não consegue se relacionar com o pai, tem dificuldade para fazer amigos e se expressar com os que estão a sua volta. Durante todo o anime, ele e outros personagens tentam encontrar motivações para que ele saia deste estado. Esse conflito existencial vivido pelos personagens, que não é externo, mas interno, caracteriza uma minitrama.

Apesar de Evangelion tocar em uma superfície bastante concreta, alguns acontecimentos do anime são bastante imagéticos, principalmente da metade para o final. Certas situações vão ganhando um potencial simbólico e contemplativo bastante enigmáticos. Os Evas são maquinas, mas ao mesmo tempo existe a possibilidade de eles não serem. A estrutura dos episódios tem uma certa continuidade, mas que em sua maioria, com decididos de episódio a episódio. (Importante salientar que estrutura episódica e bastante comum no formato de seriados). Esses eventos mais imagéticos e simbólicos e Evangelion também o colocam dentro de uma antitrama.

E como dito anteriormente, o conflito externo (esse causados pelos Anjos) também é ponto de partida para os conflitos internos enfrentado pelos personagens, e também para os acontecimentos imagéticos e simbólicos do anime.


Episódio 25 e 26

Já sabemos que o anime se estrutura narrativamente através das 3 estruturas distintas, e de forma até bastante equilibrada. Os dois episódios finais do anime concretizam muito bem os problemas psicológicos e existenciais dos personagens, e também aborda isso com essa relação mais imagética, e até experimental em certo grau. O conflito principal com os Anjos é praticamente deixado de lado, focando única e exclusivamente no estado emocional. O anime não segue uma linearidade nesses dois episódios finais, passando bem a confusão mental enfrentada pelos personagens.


The End of Evangelion

O conflito principal ganha continuidade, com o ataque da organização das sombras SEELE invadindo a NERV. Esse conflito entra as duas organizações com o decorrer dos episódios ganham proporções apocalípticas envolvendo a unidade EVA.

No começo do episódio, Shinji entra em um estado de colapso. Já ressentido pelo coma de Asuka, e ainda mais pelo ato obsceno que comete enquanto a personagem está em coma.

Hideaki Anno ainda encontra soluções que unem tanto as abordagens minimalistas e diretas em um resultado de grande proporção apocalíptica em forma de um imaginário simbólico e experimental. A cena da Rey se levantando em forma de Anjo é tanto algo concreto, que vemos, e ao mesmo tempo é bastante imagética e simbólica.

Eu acho que as escolhas narrativas, ou melhor dizendo, a trama de The End faz mais jus ao anime do que os dois episódios finais. Nessa reinterpretação do final da série, Hideaki Anno buscou concretizar o conflito principal. Apesar de conseguir (ainda que também deixando um final em aberto) dar essa continuidade aos eventos principais, ele não deixa de também dar continuidade aos conflitos internos e imagéticos abordados anteriormente. Essa construção em The End é quase homogênea.




Henrique Neves é fundador, administrador e escritor do site Casa dos ReviewersFormado na faculdade de Jogos Digitais da Universidade Nove de Julho e estudante ativo (autônomo) de linguagem cinematográfica e animação.

Cargo: Administrador/Escritor

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